Em livro

Um olhar sobre o significado político, <br>social e humano

«Sim! Despenalizar o aborto. Proteger a maternidade e paternidade. Garantir o planeamento familiar e a educação sexual» é o título do livro que acompanha, esta semana, a edição do Avante! O lançamento do livro realiza-se, hoje, pelas 18h00, na União das Associações do Comércio (Rua Castilho, 14, Lisboa) e contará com a participação de Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, e de Allen Gomes, psiquiatra.

Não basta estar pelo «Sim» Dia 11 de Fevereiro é preciso ir votar

Com esta publicação pretende-se destacar a actualidade de se proceder a um olhar sobre o significado político, social e humano da continuada sujeição de sucessivas gerações de mulheres ao aborto clandestino; as consequências da privatização em curso na área da saúde e os retrocessos na saúde sexual e reprodutiva das mulheres; a acessibilidade à contracepção, pílula do dia seguinte e à pílula abortiva; os direitos sexuais e reprodutivos dos jovens; o atraso na implementação da educação sexual nas escolas e outras questões da actualidade.
Poderão ainda ser lidas as intervenções proferidas no acto de lançamento da Campanha do PCP pelo «Sim à despenalização – Fim ao aborto clandestino e dos julgamentos», bem como a referência a alguns registos da longa caminhada e a acção que os comunistas desenvolveram neste âmbito para que a luta pela despenalização do aborto em Portugal tenha êxito.

Álvaro Cunhal
e a tese sobre o aborto


O leitor pode ainda conhecer a brilhante «Tese sobre o Aborto», de Álvaro Cunhal, elaborada em 1940. Este trabalho continua a ter uma actualidade incontornável dado que o problema do aborto, apesar das alterações políticas, económicas, sociais e jurídicas verificadas, continua por resolver ocupando um lugar importante na discussão política dos últimos anos.
Apesar das profundas transformações ocorridas, e passados que são 66 anos sobre a defesa da tese, mantêm-se ainda hoje alguns dos aspectos mais gravosos da situação, nomeadamente: a clandestinidade da maioria dos abortos, as causas económicas e sociais que levam muitas mulheres a ele recorrer, as efectivas discriminações de classe, a perseguição judicial das mulheres e a ineficácia das leis penais.
Entretanto, Portugal continua a ser um dos últimos países da Europa onde as mulheres são perseguidas e condenadas pela prática de aborto. Será preciso esperar mais 66 anos para que este estado de coisas termine?

Dramática realidade nacional

Recuemos então no tempo. No contexto histórico em que é apresentada, a tese é uma verdadeira ousadia. Por um lado, porque numa época em que os direitos das mulheres eram ainda uma realidade distante nos países capitalistas e inexistente em Portugal, Álvaro Cunhal, com apenas 26 anos, escolhe para estudo uma dramática realidade nacional, o aborto, que afecta milhares de mulheres portuguesas.
Por outro lado, porque defende a sua tese, numa perspectiva marxista, plena de ideias e referências profundamente progressistas e revolucionárias, sob escolta policial e perante um júri de exame composto por célebres personalidades do regime fascista.
Mas, talvez, o que mais fascine na tese seja a sua capacidade (passados que são 66 anos!) não só ao nível do tema mas também nas concepções, da discussão e das propostas nela contidas. É assim que encontramos, entre outros, conceitos como «direitos fundamentais da mulher», direitos das crianças, despenalização do aborto, direitos da mulher trabalhadora tais como o direito à protecção durante a gravidez, licença de maternidade paga, direito da mulher à cultura e aos tempos livres, direito à contracepção, a necessidade de mudança de mentalidades e de uma nova moral sexual, a aceitação das relações sexuais independentemente do casamento, a defesa das mães solteiras, o encarar das prostitutas como vítimas, a referência às violações e em particular às violações em tempo de guerra.

«Justiça em Movimento pelo Sim»

Realizou-se, na passada semana, no Hotel Berna, em Lisboa, uma tertúlia sob o tema «Em Movimento pelo Sim», no sentido de debater a questão levada a referendo, no próximo dia 11 de Fevereiro que é, antes de mais, uma questão de política criminal.
No encontro, estiveram presentes vários mandatários e apoiantes do «Em Movimento pelo Sim», entre os quais o Juíz Conselheiro Jubilado Guilherme da Fonseca, Fausto Leite, advogado e professor universitário, Joaquim Dionísio, advogado, Dulce Rebelo, professora universitária, António Cluny, Procurador Geral Adjunto no Tribunal de Contas.
Esta iniciativa abordou a temática da necessidade da alteração de uma lei penal, injusta e ineficaz, abordando ainda matérias relacionadas com o Direito Constitucional e Direito do Trabalho (nomeadamente as questões que se relacionam com a protecção da maternidade e paternidade no seio das relações laborais) que justificam a urgente alteração do actual quadro penal que criminaliza, com pena de prisão até três anos, a mulher que interrompa uma gravidez não desejada.


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As mulheres não são «criminosas»

O conjunto das forças que se opõem à despenalização da IVG, como aconteceu em momentos anteriores, designadamente na campanha do referendo de 1998, usa argumentos e imagens deliberadamente chocantes e de clara manipulação dos sentimentos, inclusive religiosos, convergindo na deturpação e num desrespeito total pela verdade, pela sensibilidade e pela inteligência das pessoas, visando impedir um debate sereno e clarificador realizado em igualdade de circunstâncias.

Uma questão de justiça

O debate actual acerca da interrupção voluntária da gravidez, até às 10 semanas, a pedido da mulher, coloca na ordem do dia a necessidade de intervir e tomar posição de forma séria e responsável, sobre um problema de natureza social e política, mas com fortes implicações filosóficas, teológicas e culturais que determinam comportamentos e atitudes marcadas pelas ideias dominantes da sociedade em que vivemos.

Aborto Clandestino Existe <br>– É urgente mudar a lei

Para o PCP, a luta pela despenalização do aborto, possuindo um valor e urgência próprias, é indissociável da garantia da protecção da função social da maternidade e paternidade; da implementação dos serviços de saúde e de uma adequada rede de consultas de planeamento familiar; e da implementação da educação sexual nas escolas. É preciso continuar a lutar pelo cumprimento de direitos constitucionais que – no plano laboral, da segurança social, da habitação, da saúde e do ensino – assegurem condições económicas e sociais que garantam o direito da mulher e do casal de decidirem sobre o momento e o número de filhos que desejam e podem ter. A acção e luta do PCP por uma sociedade mais justa e humana têm no próximo dia 11 de Fevereiro e no voto «Sim» um importante momento de afirmação desse objectivo e um inadiável passo no caminho da dignificação das mulheres portuguesas.